Depois de mais de 45 anos de heroica resistência, cedi e pela primeira vez coloquei o pé em uma academia. Virou uma necessidade. O corpo humano não foi feito para ficar horas sentado à frente de um computador escrevendo relatório.
A maior parte da história da raça humana é de vida ao ar livre exposta às ameaças e vivendo da caça. A adaptação nos presentou com um corpo para correr e todo um sistema de alertas.
O alerta da fome impulsionava nossos antepassados a ter ganância, no sentido mais puro da palavra, da gana de ter algo para comer. Era o impulso necessário para sair para caçar e sobreviver.
O alerta do medo era o que os mantinha vivos. Na selva avaliavam rapidamente se os animais eram oportunidades ou ameaças para atacar ou fugir.
Naturalmente o imobilismo foi excluído da herança genética. Ganância e medo prevaleceram, influenciando os mercados financeiros desde sempre.
O mercado imobiliário não é exceção, mas diferente das reações imediatas de medo e ganância individual, coletivamente passamos longos períodos de ganância seguidos de longos períodos de medo.
Nos períodos de ganância tudo é festa. Compradores se sentem confiantes para pegar financiamento com enormes prestações. Os especuladores nem podem esperar pelo próximo lançamento para comprar na planta e os construtores ficam enlouquecidos para comprar terrenos e vender projetos o mais rápido possível.
Nos períodos de medo é tudo ao contrário. Compradores evitam financiamento, os especuladores desaparecem e construtores ficam deprimidos porque o estoque de imóveis só cresce.
Medo e ganância são os componentes básicos que influenciam demanda e oferta e causam os movimentos cíclicos de mercado, como um cinema que sempre passa apenas um filme sempre com o mesmo roteiro
O operador do projetor é desatento, às vezes erra na velocidade e na iluminação. O filme pode passar muito rápido ou devagar, meio escuro ou muito claro. Nunca sabemos qual tecla irá apertar.
Também não conhecemos a velocidade e intensidade dos movimentos do ciclo de negócios imobiliários, contudo sabemos que o roteiro nunca muda.
Vai sempre ser mais ou menos assim: com ganância e preços no pico, construtores lançam projetos como se não houvesse amanhã, os especuladores lutam para comprar na planta para ter lucro fácil alguns meses depois.
O comprador final pega uma simulação no banco, chora com o tamanho das prestações e se resigna com aluguel ou adiar a mudança. O mercado fica empoçado, é muito difícil vender.
A etapa seguinte é literalmente de quem pode mais e chora menos. Construtores e especuladores com dinheiro no bolso se recusam a reduzir seus preços, mas os desesperados (e endividados) vendem a qualquer preço para sobreviver.
Ainda é cedo para comprar e tarde para vender e o mercado fica em um impasse. O estoque de imóveis atinge o pico e o preço finalmente cede até que consumidores finais se convençam que não haverá mais redução e que a prestação é pagável.
Os mais corajosos começam a comprar. O preço mínimo do ciclo é definido. Daqui em diante os estoques começam a reduzir e a velocidade de venda a melhorar. As construtoras voltam a lançar.
Com uma boa resposta de venda, testam aumentos de preço, acompanhando os rendimentos dos compradores. Se os preços mais altos “pegarem”, tentam novos aumentos.
Terrenos, mão de obra e equipamentos já não são suficientes. Especuladores entram novamente de cabeça e os preços finalmente atingem um novo pico que eventualmente conduzirá para um novo ciclo de baixa.
Não sabemos exatamente o tempo para fazer o giro completo, mas podemos apontar com precisão a posição atual do mercado: redução de estoques e construtores iniciando um novo ciclo de lançamentos.
O preço mínimo é coisa do passado e a direção é de uma recuperação contínua cuja única variável desconhecida é o tempo de reação, sendo uma boa oportunidade para os investidores.
Grande abraço.
Marcio Fenelon
Co-Fundador Quaest Europa